CACOS - O OFÍCIO SOLITÁRIO DO AUTOR

Às vezes, leio autores iniciantes. E nem precisa ser jovem, pode ser obra de pessoa madura que se aventura numa estreia como ficcionista. Em muitas dessas leituras, percebo logo nas primeiras páginas, a história é riquíssima e cheia de possibilidades, mas foi mal resolvida. 

O problema mais comum, talvez porque seja fácil narrar assim, é a escolha do narrador intruso em terceira pessoa. O resultado, na maioria dos casos, é uma escrita cheia de explicações desnecessárias e até óbvias, que retiram do leitor a riqueza de poder construir mentalmente as necessárias lacunas de entrelinha, porque entendo as camadas "subterrâneas" do texto como indispensáveis à boa literatura.

Narrar em terceira pessoa e apenas descrever, sem opinar, e nunca emitir juízos de valor (cacoete bem comum), torna-se muito mais difícil e quase ninguém faz essa opção. O narrador intruso e explicadinho escreve demais. Esses livros, se editados por mim, perderiam 30% de suas páginas, no mínimo.

A Feira do Livro é plural. Tem espaço para as pessoas que escrevem e lançam livros e também para os escritores.

Alguns ficcionistas anteciparam as coisas do mundo. Júlio Verne, George Orwell, Aldous Huxley, tantos outros. Eu penso que o artista tem, por algum motivo que não sei explicar à luz da ciência, uma capacidade de captar o inconsciente coletivo e até antever o futuro. Também acredito que, quando fazem isso, não percebem a importância do que está canalizado. Aurora que surge. 

Por que escrever com o pensamento no dinheiro? Somos escritores, ou vendedores? Somos as duas coisas? 

Mágico faz truques, mago faz magia. Escritor é "demiurgo" e veio antes.  Vença um dragão e fale com o Pinóquio. Assimile material bruto e processe, revire, futrique. Do mexe-remexe, emerge um novo contexto. Essas modulações de tom, exigidas à adaptação, emprestam a verossimilhança perseguida pelo autor que, eventualmente, transmite confiança ao leitor, ou espectador, que responde com empatia à mensagem.

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