CACO FOI MORTO POR HÉRCULES


Na escola, ao invés de prestar contas da tabuada, eu gostaria que tivessem me exigido de memória, na ponta da língua, alguns pontos da literatura dos antigos. Nada nos ensinam sobre a mitologia e o pouco que nos chega surge envolto em camadas desinfetantes aplicadas pela indústria cinematográfica. Brad Pitt é o Aquiles que nunca teve um amante predileto, jamais transou com homens e participa de bacanais e ménage com mulheres lindíssimas, deslumbrantemente voluptuosas.

Hércules é outro personagem que já rendeu muitos filmes, o mais recente com Dwayne Johnson. Lou Ferrigno, o Incrível Hulk da série televisiva nos anos 80, egresso do fisiculturismo para o cinema como Arnold Schwarzenegger, também interpretou o filho de Júpiter com a mortal Alcmena. Quem? Pois é, os deuses da mitologia interagiam com os homens. Aquelas histórias, por óbvio, derivam de adaptações das narrativas conservadas na tradição oral, geração a geração, algumas baseadas em fatos reais. 

Atenção, leitores afoitos! Quando eu falo em histórias muito antigas baseadas em fatos reais, ainda não estou levando a sério os monstros mitológicos. Esqueletos milenares de pessoas com altura inexplicável, exageradamente acima da média, aqui e acolá, volta e meia surgem em escavações arqueológicas. Daí que os “gigantes” não seriam necessariamente sobrenaturais, nem fruto de intervenção divina, ou surgidos da criatividade humana. 

O décimo dos doze trabalhos de Hércules, por exemplo, foi uma arriscada ação de abigeato, que então não levava esse nome, mas hoje é uma palavra que remete a roubo muito conhecido aqui no Rio Grande do Sul (estamos no mês Farroupilha, vou pular aquela parte da história em que alguns dos nossos grandes vultos do passado enriqueceram roubando bois e vacas). A importância da mitologia, insisto, extrapola a minha curiosidade de escritor. Basta lembrar que a psiquiatria e a psicologia se apropriaram de algumas dessas narrativas para nos explicar, compreender os arquétipos que formam os arcabouços e também os calabouços das nossas cabecinhas de melão. Mito, símbolo e arquétipo na psicologia analítica. Complexo de Édipo e narcisismo talvez sejam as expressões mais conhecidas por repetição, não necessariamente entendimento, nós costumamos repetir superficialmente os conceitos que não dominamos. Somos os arautos da sabedoria de raspão.

Então, Hércules era filho de Júpiter com Alcmena. Juno, sempre hostil aos filhos de seu marido com as mortais, amaldiçoou o menino desde o berço, para onde enviou duas serpentes que o fortíssimo pequerrucho despedaçou com as mãos. Por artifício de Juno, Hércules restou sujeitado a Euristeus, que lhe impôs os famosos doze trabalhos e não irei listar um a um, quem desejar que pesquise no Google. A décima tarefa, citada anteriormente, consistia em levar a Eristeus os bois de Gerião. Os animais estavam guardados pelo gigante Eurítion e o seu fiel cão de duas cabeças. Ambos foram derrotados e mortos. A meio caminho de volta, outro contratempo gigantesco.  

Caco era um gigante descomunal que habitava a caverna do Monte Aventino. Hércules levava os bois de Gerião e parou para descansar. Enquanto tirava uma soneca, Caco veio e lhe tomou uma parte do gado. A fim de que as pegadas não revelassem para onde tinham sido levados, o grandão os arrastou pela cauda até a caverna, de modo que os rastros parecessem indicar a direção oposta. Hércules teria sido enganado, se não tivesse passado com o resto do rebanho, coincidentemente, nas imediações da caverna. Os animais que estavam lá dentro começaram a mugir e foram descobertos. Caco foi morto por Hércules.

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